O tempo não vai apagar
Alberto Arcela
Ele não foi o último romântico, porque continua cantando no alto dos seus oitenta e três anos. Mas, sem dúvida é o menestrel do amor e o melhor tradutor das relações de todos os gêneros e idades.
Como tantos outros da minha geração, aprendi a respeitar o seu talento, mesmo quando o país se viu tropicalista e a resistência foi às ruas caminhar de mãos dadas falando de flores e seguindo atentamente a canção.
Além do que, todas as minhas amadas e amantes, sempre estiveram presentes nos versos de suas canções, ora enxugando as minhas lágrimas, que não eram poucas, ora estampando os meus sorrisos no meio de uma paixão bem resolvida.
E, de um certo modo, tudo isso começou quando ele resolveu mandar tudo para o inferno. Não o inferno da alma, que flerta com a eternidade, mas o lugar de todos que tentam, de uma maneira ou de outra, investir contra a felicidade e o amor.
Em muitas vezes fiz meus os seus versos, quando senti ciúme e até mesmo quando me apaixonei pela namorada de um amigo. E como acontecia com os livros de Rubem Fonseca, durante muitos anos aguardei que chegasse às lojas o seu mais recente LP, o que acontecia geralmente em dezembro.
Foi assim com o Inimitável, um dos melhores discos de sua carreira, e com tantos outros que serviam de fundo musical para os abraços e beijos que quase sempre terminavam na cama, antecedendo o café da manhã que a gente pedia para dois.
Vendo hoje o portfólio de suas canções, descubro que, no fundo, tudo girava em torno do amor.
Amor pelo amigo, pelo pai – terrestre e celestial – , pela natureza, e principalmente pelo corpo e alma da mulher. Nesse particular, havia a presença, como também havia a saudade.
O importante era olhar dentro dos olhos, se arrastar aos pés e até mesmo pedir perdão uma vez e outra vez. De um jeito ou de outro, o que importava mesmo era viver as emoções e compartilhar a felicidade com a sua namorada e o seu próximo.
Lembro, sobretudo de ter ouvido a sua voz entre tantas desilusões e não me envergonho de ter escutado atentamente a canção Alô, com absoluta certeza que uma das minhas grandes paixões ligaria em pouco tempo para aplacar a minha dor.
Pouco importa que ela não tenha ligado, porque eu, que nunca consegui me acostumar com a solidão, dava sempre um crédito adicional para a sua poesia, com a total convicção que da próxima vez tudo seria diferente, até mesmo porque o orgulho não vale nada.
A verdade é que tudo tem seu tempo certo, e hoje, depois de tantas curvas e aventuras, vejo que tudo que ele ensinou me fez um homem melhor, mais justo e solidário, mais religioso, mais complacente e, principalmente muito mais romântico.
E, por isso, peço licença a Chico, Gil, Caetano, Milton. Djavan e tantos outros, para me irmanar nessa data ao rei Roberto Carlos, esse moço velho, ou seria velho moço, e bem ao seu estilo, pedir a Jesus Cristo e Nossa Senhora que lhe imortalize como poeta e músico que sempre foi e será.
Afinal de contas, tem coisas que o tempo não consegue mesmo apagar.
Vida longa ao rei.