MOCIDADE, O TRIBUNO DO POVO
Rui Leitão
Quem frequentou os ambientes políticos e intelectuais de nossa capital, a partir da década de 40 até o início da década de 80,⁷6 teve a oportunidade de conhecer um personagem popular conhecido como Mocidade, que ganhou notoriedade pela oratória. Esse apelido lhe foi conferido porque sempre iniciava seus discursos com a saudação “mocidade da minha terra”.
Afirmava ter nascido em Sousa e seu nome oficial era João da Costa e Silva. Uma vez sendo perguntado se tinha algum parentesco com o presidente ditador, seu homônimo, teria respondido: “ele anda espalhando isso, mas não dou certeza”.
Era tido como um doido intelectual. Apesar de semi-analfabeto, era presença constante em velórios, onde fazia discursos enaltecendo o defunto, mesmo que não o conhecesse. Mas também se notabilizou pela veemência com que nas praças públicas discursava em defesa da liberdade e da democracia. Fez fervorosos pronunciamentos em praças públicas contra o nazismo e o fascismo. Gritou contra o Estado Novo da era Vargas. Lutou pela redemocratização na Segunda República e combateu os militares na ditadura instalada após o golpe de 1964.
Quando editado o Ato Institucional número 5, no dia 13 de dezembro de 1968, não se intimidou, subiu em um banco do Parque Solon de Lucena (a Lagoa), e mandou o verbo detonando aquela medida governamental que tirou a máscara da ditadura militar. Avisado de que poderia ser preso, se escondeu no escuro da Praça do Bispo. Dessa vez não foi preso. Porém em uma de suas raras entrevistas, interrogado sobre quantas vezes havia sido preso, respondeu: “cada discurso, uma cadeia”. Um exagero, certamente, mas que confirmava sua fama de orador que enfrentava os políticos poderosos de plantão.
Era amigo pessoal do governador João Agripino, de quem recebeu o convite para morar num quartinho no quintal da residência oficial, naquela época localizada na praia do Cabo Branco. Certa vez, num desses inflamados discursos, solidarizando-se com os estudantes em greve, que protestavam contra o governo do Estado, não poupou seu amigo, o governador João Agripino, e proferiu uma mensagem fortemente de oposição e de crítica à postura do governo naquele episódio. Tomando conhecimento do fato, o governador ficou até tarde da noite, deitado em sua rede na varanda da casa, esperando a chegada do seu hóspede rebelde. Ao vê-lo chegar lhe interpelou, questionando sobre as razões pelas quais ele se posicionara contra quem lhe oferecia abrigo e comida. Respondeu no ato: “João, governo foi feito pra sofrer”. E nada mais disse, nem o governador também se sentiu à vontade para continuar na repreensão.
Gilvan de Brito, seu biógrafo, no livro “O Anjo Torto”, editado em 1985, reconhecia que Mocidade “simbolizava independência e liberdade”, e soube representar “a consciência do povo paraibano”, como bem disse o historiador José Octávio de Arruda Melo. Atribui-se a essa destacada figura humana de nossa cidade em tempos pretéritos, a frase: “Na Paraíba, pra ser doido precisa ter juízo”. Dizia Aristóteles: “Nunca existiu uma grande inteligência sem uma veia de loucura”.